No início dos Anos 80, mais precisamente no ano de 1982, como Delegado Regional da cidade de Guajará-Mirim tinha sérios problemas com relação ao pouco efetivo para atender a cidade de Guajará e seus distritos e vilarejos como Surpresa, Iata, Vila Nova e Abunã e para agravar essa minha dificuldade, explodiu nas proximidades de Vila Nova o famoso Garimpo do Arara, atraindo para nossa região alguns milhares de garimpeiros.
No Distrito de Vila Nova mantinha ali com muita dificuldade um efetivo de cinco ou seis homens, dentre eles o policial Marcos Marinho.
Certo dia, recebo a preocupante noticia de que num confronto com dois indivíduos oriundos do garimpo e que estavam perturbando na localidade de Vila Nova – hoje cidade de Nova Mamoré – quando foram abordados pelo Alailson Quadros, conhecido por Manga Rosa em razão de um grande sinal na sua face, quando então os abordados reagiram ameaçando de morte o citado policial, quando então o mesmo comunicou o ocorrido a Marcos Marinho, que em companhia do falecido policial, Raimundo Martins de Souza, apelido “Dego” , o policial Walter Alves Fernandes, o Cachorro Doido e Paulinho, o próprio Manga Rosa e o finado Lindemberg. questionou os indivíduos que subitamente sacaram das cinturas facas e feriram gravemente Marquinhos, que foi atingido com um facada no peito,que atravessou seu pulmão, tendo então policiais reagido a injusta agressão e atirado contra os dois agressores atingidos ambos com diversos tiros.
Logo depois Marquinhos e os dois sujeitos sido socorridos para o Hospital Regional de Guajará, onde todos apresentavam estado críticos de saúde, tendo eu na mesma noite, cuidado de assegurar socorro ao policial ferido, inclusive com doação de sangue, tendo solicitado aos colegas policiais, promovendo ainda a guarda e a segurança do mesmo e colocado um efetivo para vigiar os dois indivíduos, pois sabedores do que haviam aprontado, poderiam tentar fugir do hospital.
Ainda no hospital uma médica plantonista veio me solicitar policiais para que doassem sangue aos dois indivíduos o que de pronto retruquei, dizendo que se alguém da equipe quisesse fazê-lo até poderia, mas jamais para atender pedido meu e de fato nenhum dos policiais se prontificou a doação.
Na mesma noite, dei inicio ao apuratorio e já tratei de ouvir todas as pessoas que haviam presenciado o incidente, inclusive recolhendo a faca e os revolveres utilizado pelos policiais, para os indispensáveis exames periciais.
Já na manhã seguinte, fui surpreendido com entrevista do então prefeito Isaac Benesby, dizendo que poderia ter ocorrido excessos por parte dos policiais e que ele o prefeito já havia me determinado que instaurasse inquérito policial e desarmasse os policiais envolvidos, sem que o mesmo tivesse trocado uma única palavra comigo, nos últimos dias.
Como não poderia deixar de ser, fiquei bem aborrecido com a declaração do prefeito – com quem até mantinha boa relação de amizade – e então tive a ideia de chamar até a Delegacia o falecido policial Eguiberto, conhecido por Careca, que paralelamente comandava na rádio local um prestigiado programa policial e pedi para ele Careca me questionasse sobre o incidente e sobre as declarações do prefeito e ato continuo ao ser perguntado, soltei o verbo e disse que o prefeito estava equivocado de suas competências e suas atribuições e com certeza o mesmo não tinha nenhum poder sobre a minha pessoa delegado, que só se reportava ao Secretário e Diretor Geral da Policial e com relação aos processos ao juiz da comarca. Dei a entender ainda na entrevista, que ele o prefeito estava tentando tirar proveito político do triste episódio.
Tal entrevista teve grande repercussão na cidade de Guajará e toda região aonde chegava a Rádio e claro o Prefeito Isaac ficou bem incomodado comigo e já tratou de comunicar ao Secretário de Segurança Humberto Morais de Vasconcelos, que me telefonou e tentou me constranger dizendo que eu não deveria ter desrespeitado o prefeito, quando de maneira educada disse ao mesmo que o desrespeitado no caso tinha sido eu, já que ele o prefeito tinha passado ao publico a ideia que eu seria um subordinado dele e que eu não aceitava e se fosse preciso faria de novo. Tendo o secretario bruscamente encerrado a conversa comigo, ou seja, batido o telefone sem nem dizer até logo.
Ainda no mesmo dia, recebi no meu gabinete a gerente de uma das Empresas de Isaac Bennesby, Sra. Rosa, que de forma bem sutil e educada foi me dizendo: “Dr. Pedro Marinho, o senhor sabe que portador não merece pancada, mas vim até aqui a mando do Seu Isaac Bennesby para solicitar que o senhor desocupe a casa em que mora, que é de propriedade dele Bennesby e que foi cedida a Secretaria de Segurança Publica. Tendo eu de bate pronto respondido: ‘ Dna. Rosa, a senhora tem toda razão, mas vou também lhe fazer de portadora para dizer ao Isaac – era assim que eu o chamava – que ele comete mais um equívoco, pois como a senhora mesmo acabou de dizer, eu não tenho nenhum tipo de locação com ele e, portanto, que ele peça o imóvel ao Secretário de Segurança.’ Diante da minha resposta a mesma se retirou e mais tarde ainda fui visitado por diversos amigos de Isaac Bennesby dentre eles o procurador geral do Município, Dr. Vicente, que veio em nome do prefeito, me pedir uma retratação, pois caso não fosse feita, não haveria espaço para eu continuar à frente da Regional de Guajará, quando de forma educada respondi ao procurador que não haveria retratação de minha parte e caso ele o prefeito estivesse insatisfeito comigo que conseguisse junto a quem de direito a minha transferência, pois eu estava ali sacrificadamente, pois trabalhava como único delegado e sem escrivão, contando apenas com a boa vontade da escrivã ad hoc Judite Moura e abnegados agentes policiais.
O fato é que dias depois, conclui o inquérito sobre o incidente em Vila Nova e mandei cópia para a Corregedoria Geral da Polícia, inocentando os policiais envolvidos, tendo o Corregedor concordado com o meu relatório, sem instaurar nenhum procedimento contra os policiais, tendo ainda naquela ocasião ainda sido procurado pelo Promotor de Justiça Osmar da Rocha Campos, conhecido por Osmarzinho, que me disse ter ficado admirado pelo trabalho realizado nos autos e particularmente o zelo que eu tive em não incriminar os policiais, me felicitando muito pelo trabalho, pois ele imaginava que dependendo do inquérito, teria ele que denunciar os policiais por excessos.
Exatamente 18 anos depois de tal fato, o promotor Osmar, já aposentado como Procurador de Justiça foi convidado pelo Governador Jose de Abreu Bianco para ser Corregedor Fiscal do Estado e eis que para minha surpresa, Osmar me procurou para me integrar a sua equipe como um dos corregedores e indagado por que a minha pessoa, ele Osmar relembrou o trabalho realizado em Guajará e muito especialmente o inquérito envolvendo os policiais e concluiu o convite dizendo: ‘Dr. Pedro Marinho, o senhor tem o perfil que o governador deseja para o importante trabalho e ao dizer isso ele Osmar me mostrou o rascunho do expediente que iria enviar solicitando a minha nomeação, exatamente tratando da minha aptidão para o difícil mister, apurar eventuais desvio de conduta de servidores da Secretaria das Finanças.
O fato é que tive a honra de integrar a equipe de Corregedores e posteriormente com o pedido de exoneração do Dr. Osmar, fiquei como Corregedor- Chefe até o final da gestão de José Bianco.
Ao concluir essa narrativa quero deixar registrada a minha admiração e o reconhecimento a toda equipe de policiais de Guajará-Mirim, muito especialmente ao policial Marcos Marinho, que mesmo ferido no incidente com os dois desordeiros, contando com a ajuda dos bravos colegas, reagiu a grave agressão e fez valer a lei e a ordem, naquela localidade então denominada de Vila Nova.