Hélio Doyle é jornalista, foi professor da Universidade de Brasília e secretário da Casa Civil do governo do Distrito Federal
Que o Congresso Nacional é o tipo de ambiente que não se recomenda a ninguém, todos já sabem. Ali circulam alguns dos maiores ladrões do país, práticas nefastas são encaradas com naturalidade, há muita gente trabalhando pouco ou nada e ganhando muito dinheiro. Gasta-se muito dinheiro público com inutilidades, mordomias e privilégios incabíveis, tanto para parlamentares quanto para servidores.
No Congresso Nacional, tudo se compra e se vende. Não são todos, mas senadores e deputados ficam atrás das “oportunidades de negócios”. Vendem não só as emendas em medidas provisórias, como mostra a Lava-jato. Com auxílio de “operadores” muito bem remunerados com dinheiro público, vendem projetos de lei, votos, pronunciamentos, pareceres, convocações e desconvocações em comissões, abertura e fechamento de CPIs. “Lobistas”, que não são lobistas autênticos, mas bandidos de terno e tailleur, negociam e fazem os pagamentos. Quase todos lá dentro sabem disso, mas vigora a lei do silêncio e da cumplicidade entre os poderosos e o medo entre os subordinados.
A maioria dos jornalistas também sabe o que acontece. Mas as mutretas de suas excelências só aparecem quando alguém denuncia ou faz a delação premiada. A imprensa brasileira, de modo geral, deixou a investigação de lado e se apoia em vazamentos interessados e dossiês. E há os jornalistas que, para manter suas fontes e seus empregos, fingem que nada sabem e falam do Congresso como se fosse tudo o que acontece ali fosse normal. “A política é assim”, “é preciso ter governabilidade”, “alianças são necessárias” são justificativas rasteiras e comuns para as chantagens, a corrupção, o fisiologismo e as negociatas. O governo federal acaba sendo cúmplice, por omissão e por aceitar esse jogo “parlamentar” como necessário à sua sobrevivência.
Em um ambiente assim, não estranha que o debate praticamente não exista, e quando existe seja travado por parlamentares, em sua maioria, despreparados intelectualmente, deformados politicamente e alguns mais interessados em aumentar seus patrimônios pessoais do que no bem público. A deformação política passa pela demagogia exacerbada, pela falta de compromisso com os interesses da população, pelo exibicionismo mediático e pela prevalência de critérios fisiológicos e patrimonialistas na relação com os governos, seja lá quais forem.
Nos últimos anos, muitos parlamentares, certamente cientes de suas limitações, substituíram o debate qualificado de propostas e projetos por discursos simplistas, gritos histéricos e palavras de ordem, como se estivessem nas ruas. Levam para o Congresso, inclusive, o baixo nível de algumas polêmicas travadas nas redes sociais. Por isso, não se estranha que vaiem uma chefe de Estado e levantem faixas e adereços aceitáveis em manifestações e blocos de carnaval, mas não no recinto parlamentar. A questão não é a vaia ter sido a Dilma — a vaia é inaceitável, naquele ambiente, seja lá a quem for, especialmente se presidente da República.
O Poder Legislativo é fundamental para a democracia e precisa ser respeitado pelos demais poderes e pelo povo. Mas nosso Congresso, infelizmente, não se faz respeitar. Basta ver, a propósito, quem são os presidentes da Câmara e do Senado. E quem não respeita a si próprio, não merece o menor respeito dos outros.
O Congresso, hoje, é uma piada de péssimo gosto.