Presídios na areia – Jair Queiroz

WhatsApp
Facebook
Twitter



Nos últimos dias a população de Londrina esteve sob o estresse provocado por uma rebelião na Penitenciária Estadual, a PEL II, que resultou em feridos dentre os detentos tomados como reféns e muita destruição do patrimônio público. Felizmente tudo se acalmou em poucas horas. O episódio é oportuno para trazermos uma reflexão sobre a prática penal do encarceramento e as implicações dela sobre a natureza humana que é propensa à liberdade desde o nascimento.

O descumprimento das regras de convivência social quebra a harmonia nos relacionamentos e desencadeia o desrespeito, intolerância, violência e fomenta as diversas modalidades de crimes. Para corrigir essa situação o Estado pune os criminosos aplicando-lhes a pena restritiva de liberdade, mantendo-os afastados do convívio social para que sejam reeducados e reinseridos no sistema após da conclusão da penalidade. Seria simples se realmente funcionasse como a sociedade espera, mas infelizmente o que constatamos é que se nada de bom entra nas cadeias, pior ainda é o que sai delas. Ocorre que a pena de reclusão como é aplicada em nosso sistema não é eficiente para mudar a realidade psicológica do apenado, que pela ótica da saúde mental é uma pessoa que se encontra adoecida no sentido social/afetivo e emocional. Esse ser cindido é colocado entre outros nas mesmas condições e espera-se que por um processo simbiótico, através do sofrimento, se restabeleçam a ambos, resignados e arrependidos do mal que fizeram.

Um fenômeno comum observado nos presídios é o processo da aglutinação, a formação de vínculos sociais entre presos que se unem para garantir proteção contra grupos rivais – e até mesmo de atos do Estado, nem sempre tão legítimos – e realizar suas necessidades fundamentais para a sobrevivência. Esses vínculos às vezes são estruturados a tal ponto que formam uma sociedade paralela, com normas de convivência, comandos, leis etc. São as chamadas facções. São fenômenos explicáveis pela ótica das necessidades sócio emocionais da pertença e são proporcionais às lacunas deixadas pelo Estado no tocante à proteção e a dignidade do preso. As penas, em geral, ultrapassam os limites da privação da liberdade e usurpam do apenado a possibilidade de “vir a ser um ser humanizado”, o que em verdade é o seu principal objetivo.

O estresse proporcionado pela limitação das necessidades corpóreas, o medo, a angústia de morte acionada pelo instinto de sobrevivência perante os maus-tratos, ameaças, doenças e abusos de toda sorte, justificam no preso o desejo de libertar-se, o que é natural nessas condições. No ambiente caótico gerado no interior dos presídios nada dignificante pode acontecer, mas ao contrário, agravar a experiência auto e hetero destrutiva de quem se encontra em desordem intrapessoal e interpessoal. As condições físico-estruturais são importantes para amenizar os riscos de descontentamento que produzem as reações em cadeia, estopim das rebeliões, porém não são as mais importantes. O tratamento digno e respeitoso, necessário ao se lidar com pessoas, condição que – quer a sociedade aceite ou não, permanece no apenado apesar dos crimes que praticou – é que pode amenizar esse ímpeto.

Assim, como nos tratamentos dispensados aos hospitais, urge que humanizemos os nossos presídios, através de estrutura adequada, profissionais qualificados, atenção à

saúde, estudos, cultura, lazer, religiosidade, qualificação profissional etc, objetivando o cumprimento das suas atribuições fundamentais que é a de reeducar e reinserir os detentos na sociedade, devolvendo-os como cidadãos úteis a si e a seus iguais e atingirmos, enfim, o objetivo principal que é a diminuição dos índices de criminalidade. Até lá, no máximo, seguiremos construindo presídios na areia.

Jair Queiroz – É sindicalizado e Psicólogo, pós-graduado em segurança pública em Londrina.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Últimas Notícias

Screenshot_20241010_083144_WhatsApp
Nesta sexta-feira, café da manhã no Sinpfetro
IMG-20240918-WA0281
Luto - Renato Gomes Abreu
Screenshot_20240916_193205_Gallery
Luto - Mauro Gomes de Souza
Screenshot_20240804_200038_Facebook
BEE GEES E O BULLYING - Jair Queiroz
Screenshot_20240730_075200_WhatsApp
Nota de pesar - OLINDINA FERNANDES SALDANHA DOS SANTOS
Screenshot_20240718_121050_WhatsApp
Luto - Adalberto Mendanha
Screenshot_20240714_160605_Chrome
Luto - Morre Dalton di Franco
Screenshot_20240702_125103_WhatsApp
Luto - Cleuza Arruda Ruas
Screenshot_20240702_102327_WhatsApp
Corpo de Bombeiros conduz o corpo do Colega Jesse Bittencourt até o cemitério.
Screenshot_20240701_163703_WhatsApp
Luto - Jesse Mendonça Bitencourt

Últimas do Acervo

Screenshot_20241020_205838_Chrome
Dez anos do falecimento do colega, Henry Antony Rodrigues
Screenshot_20241015_190715_Chrome
Oito anos do falecimento do colega Apolônio Silva
Screenshot_20241005_173252_Gallery
Quatro anos do falecimento do colega Paulo Alves Carneiro
Screenshot_20240929_074431_WhatsApp
27 anos do falecimento do José Neron Tiburtino Miranda
IMG-20240918-WA0281
Luto - Renato Gomes Abreu
07-fotor-202407269230
Vário modelos de Viaturas usadas em serviço pela PC RO
Screenshot_20240831_190912_Chrome
Dois anos da morte do colega Aldene Vieira da Silva
Screenshot_20240831_065747_WhatsApp
Quatro anos da morte do colega Raimundo Nonato Santos de Araújo
Screenshot_20240827_083723_Chrome
Quatro anos da morte do colega Altamir Lopes Noé
Screenshot_20240811_181903_WhatsApp
Cinco anos do falecimento do colega Josmar Câmara Feitosa

Conte sua história

20220903_061321
Suicídio em Rondônia - Enforcamento na cela.
20220902_053249
Em estrada de barro, cadáver cai de rabecão
20220818_201452
A explosao de um quartel em Cacoal
20220817_155512
O risco de uma tragédia
20220817_064227
Assaltos a bancos continuam em nossos dias
116208107_10223720050895198_6489308194031296448_n
O começo de uma aventura que deu certo - Antonio Augusto Guimarães
245944177_10227235180291236_4122698932623636460_n
Três episódios da delegada Ivanilda Andrade na Polícia - Pedro Marinho
gabinete
O dia em que um preso, tentou esmurrar um delegado dentro do seu gabinete - Pedro Marinho.
Sem título
Em Porto Velho assaltantes levaram até o pesado cofre da Padaria Popular
cacoal
Cacoal nas eleições de 1978 - João Paulo das Virgens