O colegiado entendeu que foi ilegal a decisão do então juiz Sergio Moro de incluir a colaboração de Palocci nos autos do processo que apura se a Odebrecht doou, como propina, um terreno para a construção do Instituto Lula.
Por MATHEUS TEIXEIRA/FOLHAPRESS
Celso de Mello e Cármen Lúcia, que também integram a 2ª Turma, não participaram da sessão e o resultado ficou em 2 a 1. (Foto: Reprodução)
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A 2ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta terça-feira (4) que a delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci não poderá ser usada na ação penal contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que tramita na 13ª Vara Federal de Curitiba.
O colegiado entendeu que foi ilegal a decisão do então juiz Sergio Moro de incluir a colaboração de Palocci nos autos do processo que apura se a Odebrecht doou, como propina, um terreno para a construção do Instituto Lula.
A inclusão nos autos ocorreu a seis dias do primeiro turno da eleição presidencial de 2018 e, para os ministros do STF Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, teve o intuito de criar um fato político no pleito daquele ano.
Impedido de concorrer pela Lei da Ficha Limpa, Lula foi substituído por Fernando Haddad como candidato do PT à Presidência. Ele terminou derrotado por Jair Bolsonaro.
O ministro Edson Fachin discordou dos colegas, mas ficou vencido ao votar para rejeitar o recurso apresentado pela defesa do petista.
Celso de Mello e Cármen Lúcia, que também integram a 2ª Turma, não participaram da sessão e o resultado ficou em 2 a 1.
Este também foi o placar para determinar que o processo deve voltar para a fase de alegações finais, o que atrasará um desfecho para o caso. Isso ocorreu porque Gilmar e Lewandowski entenderam que Lula não teve acesso amplo aos autos.
Assim, mandaram o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Luiz Bonat, que substituiu Moro, permitir o acesso a todos os trechos dos autos que digam respeito ao ex-presidente.
Lula foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro pelo caso do tríplex de Guarujá (SP). Nessa ação, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) definiu a pena em oito anos e dez meses, mas o processo ainda tem recursos pendentes na corte e no STF.
O ex-presidente também já foi condenado em segunda instância pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) no processo do sítio de Atibaia (SP). Inicialmente sentenciado a 12 anos e 11 meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, teve a pena aumentada para 17 anos e 1 mês.
Devido a um novo entendimento do Supremo sobre ritos processuais, essa sentença pode vir a ser anulada em cortes superiores. Se isso acontecer, o processo volta à primeira instância para novo julgamento.
O petista foi preso em abril de 2018, com base em decisão do STF que permitia que um réu condenado em segunda instância começasse a cumprir pena.
Em novembro de 2019, porém, a corte mudou sua jurisprudência e definiu que os réus têm direito a aguardar o fim do processo (o trânsito em julgado, quando não cabem mais recursos) em liberdade. Com isso, a Justiça decretou a soltura de Lula, e ele aguarda o fim da ação em liberdade.
Em relação à inclusão da delação de Palocci, Gilmar Mendes ressaltou no julgamento desta terça que ela só ocorreu três meses após ser homologado o acordo judicial para que o ex-ministro revelasse atos ilícitos que cometera.
“Essa demora parece ter sido cuidadosamente planejada pelo magistrado [Moro] para gerar verdadeiro fato político na semana que antecedia o primeiro turno das eleições presidenciais de 2018”, disse Gilmar.
O ministro citou ainda que a inclusão e o levantamento do sigilo da delação ocorreram sem pedido do Ministério Público, o que indica que Moro atuou com objetivos políticos.
“Essas circunstâncias quando examinadas de forma holística são vetores possivelmente indicativos da quebra da imparcialidade por parte do magistrado”, afirmou Gilmar, antes de lembrar que a eventual suspeição de Moro, conforme acusação da defesa de Lula, será analisada em outro julgamento da 2ª Turma, sem data prevista.
“Resta claro que as circunstâncias que permeiam a juntada do acordo de delação de Antonio Palocci no sexto dia anterior à realização do primeiro turno das eleições presidenciais de 2018 não deixam dúvidas de que o ato judicial encontrasse acoimado de grave e irreparável ilicitude”, concluiu.
Lewandowski seguiu a mesma linha e disse haver “inequívoca quebra de imparcialidade” de Moro. Ele destacou que a fase da instrução do processo já havia acabado, o que demonstra o aparente intuito de gerar fato político.
“O referido magistrado [Moro], para além de influenciar de forma direta e relevante o resultado da disputa eleitoral, conforme asseveram inúmeros jornalistas políticos, desvelando um comportamento no mínimo heterodoxo no julgamento dos processos criminais instaurados contra o ex-presidente Lula, violou o sistema acusatório bem como as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa”, afirmou Lewandowski.
Fachin, por sua vez, ressaltou que o caso não revelou gravidade suficiente para caracterizar prejuízo à defesa de Lula.
“Para fins de análise de eventual sanção penal, assim sob a ótica probatória, apenas o depoimento com o crivo do contraditório seria utilizado. Essas informações não constituem informação relevante de modo a não configurar prejuízo à defesa”, disse.
Neste caso, Lula foi denunciado pelo Ministério Público Federal por corrupção passiva e lavagem de dinheiro porque teria favorecido a Odebrecht em contratos com a Petrobras.
Desde fevereiro esse processo estava concluído à espera de uma decisão do atual juiz da Lava Jato, Luiz Bonat. Agora, porém, ele terá de aguardar a nova apresentação de considerações finais das partes para decidir se sentencia Lula.
Esta, aliás, será a terceira alegação final do petista neste caso. Em outubro de 2018, a defesa de Lula cumpriu esta etapa do processo. Depois, no entanto, o STF decidiu que o réu tinha direito a apresentar alegações finais apenas depois dos delatores.
Com isso, o prazo do caso teve de ser reaberto, o que aconteceu de novo nesta terça-feira, mas por outros motivos.
O STF já havia dado uma decisão para ampliar o acesso de Lula aos autos neste caso, quando permitiram que a defesa verificasse os arquivos eletrônicos encaminhados pela Odebrecht em seu acordo de colaboração com a Justiça.
A defesa chegou a fazer sua análise desse material ao acessar uma “sala cofre” onde estão os arquivos na Superintendência da PF no Paraná, em junho de 2018.
Os advogados, porém, afirmam que o acesso foi restrito e que as consultas permitidas eram limitadas a dois codinomes usados pelo chamado “Departamento de Propina” da Odebrecht.