Collor diz que Dilma é responsável pelo impeachmnet

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Marcos Oliveira Marcos Oliveira

 

O EX-PRESIDENTE FERNANDO COLLOR LEMBROU QUE O PARECER CONTRA ELE TINHA MEIA PÁGINA, ENQUANTO O PARECE SOBRE O IMPEACHMENT DE DILMA TEM 128. (FOTO: MARCOS OLIVEIRA)
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Em discurso agora há pouco, na sessão da admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff, o senador e ex-presidente Fernando Collor (PTC-AL) comparou o processo em curso com aquele a que ele foi submetido em 1992. Ele destacou que no seu caso decorreram apenas quatro meses entre a apresentação da denúncia até o último dia de julgamento, enquanto no caso atual já transcorreram oito meses e o ato final ainda terá seis meses para ser realizado, a partir desta noite. “O rito é o mesmo, mas o ritmo e o rigor, não.”, destacou Collor.
Durante seu discurso, as referências a Collor no Twitter fizeram dele o tema mais comentado em todo o mundo, nessa rede social.

O ex-presidente lembrou que entre a chegada no Senado da autorização da Câmara até seu afastamento provisório, transcorreram 48 horas. “Hoje, estamos há 23 dias somente na fase inicial nesta Casa. O parecer da Comissão Especial que hoje discutimos possui 128 páginas. O mesmo parecer de 1992, elaborado a toque de caixa, continha meia página com apenas 2 parágrafos – isso mesmo, 2 parágrafos!”, lembrou.

Collor lembrou ainda que se utilizou de advogados particulares, bem ao contrário de Dilma, cuja defesa tem sido promovida pela Advocacia Geral da União. E assinalou:

– Dois anos depois, fui absolvido de todas as acusações no Supremo Tribunal Federal. Portanto, dito pela mais alta Corte de Justiça do País, não houve crime. Mesmo assim, perdi meu mandato e não recebi qualquer tipo de reparação. Pelo contrário: depois da renúncia, recorri ao próprio Supremo para ao menos reaver os direitos políticos que me cassaram.

Em seu discurso, o senador Fernando Collor não antecipou seu voto sobre admissibilidade do impeachment, mas criticou o comportamento de Dilma e do seu “governo em ruínas”, revelando que haver advertido sobre “os erros na economia, na excessiva intervenção estatal, nas imprudentes renúncias fiscais. Falei da falta de diálogo com o Parlamento. Nos raros encontros com a presidente, externei minhas preocupações, especialmente após a sua reeleição, quando sugeri a ela uma reconciliação de seu novo governo com seus eleitores e com a classe política.

O ex-presidente contou também que sugeriu a Dilma que fosse à televisão “pedir desculpas por tudo que se falou na campanha eleitoral, desmentido depois por seus próprios atos, nos primeiros meses do atual mandato”. Além disso, “alertei-a sobre a possibilidade de sofrer impeachment. Mas não me escutaram. Coloquei-me à disposição. Ouvidos de mercador. Desconsideraram minhas ponderações. Relegaram minha experiência. A autossuficiência pairava sobre a razão.“

A íntegra do discurso
Leia a íntegra do discurso do discurso do ex-presidente e senador Fernando Collor:

“’Ruínas de um Governo!…’

Este é o título de uma obra clássica de Rui Barbosa, de 1931. Nela, o autor afirma:

Todas as crises, (…), que pelo Brasil estão passando, e que dia a dia sentimos crescer aceleradamente, a crise política, a crise econômica, a crise financeira, não vêm a ser mais do que sintomas, exteriorizações parciais, manifestações reveladoras de um estado mais profundo, uma suprema crise: a crise moral.

Em 1992, esse trecho foi utilizado, por Barbosa Lima Sobrinho, como intróito à denúncia que apresentou contra mim.

Ruínas de um Governo!… É a expressão de Rui Barbosa para invocar as crises que atingiram o Brasil nos anos 30.

Sr. Presidente, jamais o Brasil passou, como hoje, por uma confluência tão clara, tão entrelaçada e aguda de crises na política, na economia, na moralidade e na institucionalidade. Chegamos ao ápice de todas as crises. Chegamos às ruínas de um governo, às ruínas de um país.

Este é o motivo pelo qual, aqui e agora, discutimos possíveis crimes de responsabilidade da presidente da República. Não discutimos crimes comuns – isto é pacífico! A estes, a Constituição reserva o juízo ao Supremo Tribunal Federal. Ao Senado da República cabem a pronúncia e o julgamento quanto aos crimes de responsabilidade. Esta é uma diferenciação importante. Aqui, hoje, julga-se responsabilidade.

Em 1992, em processo análogo, bastaram menos de 4 meses, entre a apresentação da denúncia até a decisão de renunciar no dia do último julgamento. No atual processo, já se foram mais de 8 meses. A depender do resultado de hoje, mais 6 meses são previstos até o julgamento final. O rito é o mesmo, mas o ritmo e o rigor, não. Basta lembrar. Entre a chegada no Senado da autorização da Câmara até meu afastamento provisório, transcorreram 48 horas. Hoje, estamos há 23 dias somente na fase inicial nesta Casa. O parecer da Comissão Especial que hoje discutimos possui 128 páginas. O mesmo parecer de 1992, elaborado a toque de caixa, continha meia página com apenas 2 parágrafos – isso mesmo, 2 parágrafos!

O tempo é outro, Sr. Presidente.

Em 1992, fui instado a renunciar na suposição de que as acusações contra mim fossem verdadeiras. Mesmo sem a garantia da ampla defesa pelo Congresso, em todas as fases, me utilizei de advogados particulares. Dois anos depois, fui absolvido de todas as acusações no Supremo Tribunal Federal. Portanto, dito pela mais alta Corte de Justiça do País, não houve crime. Mesmo assim, perdi meu mandato e não recebi qualquer tipo de reparação. Pelo contrário: depois da renúncia, recorri ao próprio Supremo para ao menos reaver os direitos políticos que me cassaram. Mesmo se tratando de matéria eminentemente constitucional – direitos políticos –, alheia ao mérito do impeachment, o Supremo negou o Mandado de Segurança sob a alegação de que não cabia à Corte se pronunciar sobre decisão do Senado, ainda que tomada após minha renúncia.

À época desta apreciação, o ministro Paulo Brossard chegou a ser interpelado pelo ministro Moreira Alves. Este chamou a atenção para a incoerência do voto de Brossard, já que, em seu livro sobre impeachment, o ministro defendia a impossibilidade do julgamento após a renúncia e, em seu voto, se manifestava de forma inversa. Ao se defender, Brossard se limitou a dizer: “Ministro Moreira Alves, livro é livro; voto é voto”. E para se justificar, assinalou:

‘Absolutória ou condenatória, justa ou injusta, sábia ou errônea, da decisão do Senado não cabe recurso, direto ou indireto. Mas isto não é novidade. Todo órgão, seja de que natureza for, que decide em única ou última instância, decide inapelavelmente, acerte ou erre.’ – encerra Brossard.

Desculpem-me por voltar no tempo. Mas o momento exige. Ainda na denúncia de 92, Lima Sobrinho pregava, e até profetizava. Escreveu ele:

‘Nos regimes democráticos, o grande juiz dos governantes é o próprio povo (…). Representar o povo significa, nos processos de impeachment, interpretar e exprimir o sentido ético dominante, diante dos atos de abuso ou traição da confiança nacional. A suprema prevaricação que podem cometer os representantes do povo, em processos de crime de responsabilidade, consiste em atuar sob pressão de influências espúrias ou para a satisfação de interesses pessoais ou partidários. Em suma, o Presidente (…) há de ser julgado (…) com base nos largos e sólidos princípios da moralidade política.’ – encerra Lima Sobrinho.

Pois bem, Sr. Presidente, ‘todas as tragédias que se podem imaginar reduzem-se a uma mesma e única tragédia: o transcorrer do tempo’, dizia Simone Weil. É o mesmo tempo imperioso do mundo que nos traz à razão.

É nesta quadra, de adversidades para uns e tragédias para outros, que constatamos que o maior crime de responsabilidade está na irresponsabilidade pelo desleixo com a política; na irresponsabilidade pela deterioração econômica de um país; na irresponsabilidade pelos sucessivos e acachapantes déficits fiscais e orçamentários; na irresponsabilidade pelo aparelhamento desenfreado do Estado que o torna inchado, arrogante e ineficaz; na irresponsabilidade pela ação ou omissão perante obstruções da justiça. É crime de responsabilidade, Sr. Presidente, a mera irresponsabilidade com o País, seja por incompetência, negligência ou má fé.

Mas não foi por falta de aviso. Desde o início deste governo, fui ao longo dos anos a diversos interlocutores da presidente para mostrar os problemas que eu antevia, e que desembocaram nesta crise sem precedentes. Falei – na minha convicção – dos erros na economia, na excessiva intervenção estatal, nas imprudentes renúncias fiscais. Falei da falta de diálogo com o Parlamento. Nos raros encontros com a presidente, externei minhas preocupações, especialmente após a sua reeleição, quando sugeri a ela uma reconciliação de seu novo governo com seus eleitores e com a classe política. Sugeri que fosse à televisão pedir desculpas por tudo que se falou na campanha eleitoral, desmentido depois por seus próprios atos, nos primeiros meses do atual mandato. Alertei-a sobre a possibilidade de sofrer impeachment. Mas não me escutaram. Coloquei-me à disposição. Ouvidos de mercador. Desconsideraram minhas ponderações. Relegaram minha experiência. A autossuficiência pairava sobre a razão.

Contudo, Sr. Presidente, reafirmo que, em amplo contexto, o todo dessa obra em ruína da atual administração tem também um pano de fundo ainda invisível para muitos: o sistema presidencialista adotado por nossa República.

Lá se vão 127 anos de crises e insurreições, de revoltas e conflagrações, de golpes e revoluções. Suplantada a aristocracia imperial, superarmos a oligarquia republicana. Convivemos com estado de sítio, com estado de exceção. Enfrentamos ditaduras, civil e militar. E, ainda hoje, estamos em processo de redemocratização.

Sob o presidencialismo usufruímos tão somente de espasmos de democracia. Não há mais como sustentar um sistema anacrônico, contaminado e deteriorado em sua essência, em sua prática e nos exemplos traumáticos de nossa República. Basta dizer que de 1926, com Artur Bernardes, até 2011, com Lula, nenhum presidente da República transmitiu o cargo a seu sucessor sob as mesmas regras que recebeu do antecessor, tendo eles cumprido integralmente seus respectivos mandatos. Pelo visto, aquelas exceções serão mais uma vez quebradas, recomeçando novo ciclo de instabilidades. Não podemos mais rechear nossa história com deposições, suicídio, renúncias e impedimentos. Não existe fórmula mágica dentro do nosso presidencialismo, ainda mais com uma lei nos moldes da 1.079, a “ressurrecta”, que dá margem a permanentes ameaças a qualquer governo. Não há como recuperar esse modelo de coalizão, de cooptação e fisiologismo, que envergonham a classe política. Enfim, não há como continuar tentando formar um número salvador, simplesmente somando zeros. Os partidos, mais do que votar, precisam formular políticas.

Por tudo isso, o sistema está em ruínas! E ruínas, Sr. Presidente, demandam reconstrução. Reconstrução requer determinação que, por sua vez, exige conscientização e admissão da verdade.

Há 11 anos vimos o choro de parlamentares decepcionados com as agruras e a verdade crua de um partido. Hoje, envoltos em tormentos muito piores, não vemos sequer uma lágrima, de constrangimento que seja. Ao contrário: o que se vê é a defesa rouca, cega, mouca e intransigente. Entre retóricas e evidências; entre quimeras e realidades, entre o golpe e a farsa do golpe, apesar de tudo e, por tudo isso, a população brasileira evoluiu na participação política. Mas admitamos, Sras. e Srs. Senadores, regredimos no agir da política.

Reafirmo: uma Nova Política precisa se estabelecer. Seja qual for o resultado de hoje, precisamos virar esta página, repensar e instituir a política pela qual a sociedade clama. O atual processo de impeachment nada mais é do que a tentativa de, a partir do passado, aplainar o presente para decantar o futuro. Um futuro em que precisaremos conciliar uma altiva e corajosa voz de comando do Executivo, com a moderadora e conciliadora voz do Legislativo.

Para concluir, reproduzo trecho do livro “Collor Presidente”, do historiador Marco Antônio Villa, que está prestes a lançá-lo. Novamente, peço a compreensão por retornar a 92. Mas a lucidez do texto reflete o que aqui vivemos. Diz o autor:

(Abro aspas) Fatos posteriores, já no século 21, amplificaram o significado da ação (ou inanição) de Fernando Collor no auge da CPI e da denúncia na Câmara dos Deputados por crime de responsabilidade. Ele respeitou as solicitações dos parlamentares, encaminhou, através do Banco Central e da Receita Federal, toda a documentação solicitada, cumpriu as determinações legais, não coagiu o Supremo Tribunal Federal e respeitou a Constituição. Isso tudo em meio ao maior bombardeio midiático da nossa história e tendo de conviver com uma acelerada tramitação da denúncia – e depois do processo – que criou obstáculos à plena defesa. Aceitou o afastamento e se preparou para a defesa no Senado. Perdeu. Buscou reparações na Justiça, defendeu-se em vários processos e acabou absolvido em todos eles – os que envolviam atos quando do exercício da Presidência da República.

A renúncia de Fernando Collor – o impeachment nunca ocorreu – deu a ilusão de que as instituições forjadas pela Constituição de 1988 tinham passado no teste. Ledo engano. Acontecimentos posteriores – e mais graves – demonstraram que a consolidação do estado democrático de direito é um longo processo, tarefa de várias gerações. A crise de 1992 não passou de um momento de ampla e complexa rearticulação das elites política e econômica no interior do Estado, posicionando-se para embates que acabaram sendo travados, ainda na última década do século 20 e no início do século seguinte, por aqueles que tinham quadros – mais do que programas – para gerir a coisa pública. (Fecho aspas)

Encerro, Sr. Presidente, dizendo: a História me reservou este momento! Devo vivê-lo no estrito cumprimento de um dever. Porém, inspiro-me no ensinamento de Holbach:

Tudo nos prova que a cada dia nossos costumes se abrandam, os espíritos se esclarecem e a razão conquista terreno. Muito obrigado.”

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